sexta-feira, 1 de junho de 2012



Siza Vieira: Casa António Carlos Siza, 1976/78 - Santo Tirso




Figura 1 - Casa Carlos Siza a partir da rua




A-     Contexto de Intervenção
                A pequena moradia, projectada para seu irmão Carlos, inscreve-se num ‘’gaveto de pendente e configuração irregular em Santo Tirso’’. Esta localidade, como muitas outras nos arredores do Porto, que de pequena vila se desenvolveu até extensas manchas de edificações entre elas , fábricas, blocos de apartamento e moradias.  Este projecto vai ser  marcado pela dificuldade de enquadrar a forma (em‘’U’)’, com a dimensão da parcela e a envolvente já edificada, resultante de um desenvolvimento desorganizado da cidade.
         ‘’Perante este caos urbano’’, de mancha edificada,’’ o edifício, cercado de muros, recolhe-se numa introspectiva forma em U, e implanta-se no extremo nascente do lote.’’  De salientar que a forma do edifício é resultante também da adaptação de um programa interno a uma topografia complexa e uma envolvente com uma ‘’ ocupação de um terreno já pré estabelecidas’’. Os muros também são parte importante do projecto, pois, originados na própria fachada do edifício, vêem o seu inicio na cota mais baixa do terreno, ‘’e vão diminuindo ao longo da rua, á medida que a pendente aumenta’’.  O arquitecto encontrou problemas também com a orientação do próprio edifício devido a legislação portuguesa tendo de readaptar a sua primeira ideia a um edifício com uma nova orientação (tinha de ter uma fachada paralela á rua), contudo atribui sempre uma grande importância ao pátio cónico exterior , devido ao caracter exterior mas privado que este tinha.
                A casa está localizada  numa rua secundária, cercada por habitações unifamiliares e  a dois quarteirões, grandes blocos de apartamentos desafortunadamente e violentamente interpõe-se na vista.
O projecto é feito e desenvolvido, pelo menos em parte, em resposta a esse contexto, com uma vontade obstinada de proteger e criar uma atmosfera íntima e acolhedora. 
                ‘’O acesso à casa é feito por uma passagem junto a um telheiro.  A monumental Bay-window no alçado principal , o mais iconográfico dos elementos compositivos , evoca a promessa de Gemütlichkeit, agora confrontada com uma urbanidade delapidada.’’
                Apesar da casa se desenvolver numa pequena área , a forma fechada e apertada dos diferentes compartimentos é compensada pela criação de eixos visuais que atravessam a habitação ‘’quer longitudinalmente quer transversalmente’’ relacionando assim a casa com a sua envolvente. 


B-     Lógica Funcional e Espacial (a partir da planta)
Figura 2 -Planta Completa

                                 
               
                Dado que o projecto da Casa António Carlos Siza desenvolve-se somente num piso, a escolha da planta torna-se logica na medida em que nesta planta é perceptível quase a totalidade do programa.
                O programa que a moradia contempla é sala de estar e jantar, quatro dormitórios, cozinha, dispensa, duas casas de banho, é desenvolvido somente num único piso, mas consegue criar um acesso a variados ambientes, sendo todo o projecto fruto do desenvolvimento de um pátio central. ‘’Tem a forma de um U encerrado (forma que o arquitecto Siza Vieira vai utilizar em projectos sucessivos)’’.  É de grande importância a maneira como é feita a articulação do programa em que apesar de haver uma ‘’subdivisão conjunta do programa em 3 partes (entre elas , Cozinha e sala de jantar – Habitação principal – Habitação dos filhos) , estas partes do programa manifestadas por três volumes mais elevados, separadas entre elas,  vão encontrar a união de todos os volumes através de um corpo que dá continuidade a todo este sistema.’’
                ‘’A reestruturar a lógica convencional deste programa , um eixo diagonal atravessa o lote e penetra a casa, numa distorção enfática na ordem tipo-morfológica.  Centrada na janela  da Sala de jantar ( Bow-Window), outro sistema geométrico transversal projecta uma parede curva tangente ao limite noroeste, e simultaneamente, define as parede da ala dos quartos numa radial centrifuga.’’ Consegue-se notar perfeitamente a tensão dado que o modo como o arquitecto desenvolve os eixos tenciona o espaço.             
                ‘’A sala de estar é assim fortemente caracterizada pela Bow-Window que se abre sobre a rua.  Do lado de fora da casa, a moradia, parece simples e modesta, envolvida pela vegetação do jardim.  No seu interior é contactado com um jogo contínuo de deslocamentos e correspondências entre paredes, vazios, painéis cegos e painéis de vidro. Ao largo da lateral sudoeste encontra-se a sala de jantar, a cozinha e a área de serviço com uma segunda Bow-Window  . A cozinha tem pouca iluminação e o mobiliário (bancos e mesa) foram desenhados á medida pelo arquitecto, tendo estes sido colocado ao lado de uma alta janela que lhes fornece luz. No outro lado da moradia (Noroeste) desenvolvem-se os quartos e as casas de banho.’' Cada ambiente consegue ter a sua autonomia , algo que o caracterize e lhe dê a sua própria identidade. De realçar também que a variação de eixos que o arquitecto utiliza  cria uma ‘’relação harmoniosa’’ com o jardim e a envolvente.               
                O pátio cónico é fulcral no projecto visto que a circulação interior desenvolve-se a partir dele funcionando como ‘’elemento de dilatação de espaço’’, este vai sendo comprimido, deixando uma passagem mínima para o jardim. ‘’O contraste de cor entre a marca azul e amarela dos seus limites. É um espaço muito bonito em que a forma e a cor, sombras e pétalas  (roxo e rosa) caído no chão de uma árvore torta, não só valoriza o espaço exterior, como  também invadem os interiores. Cada atmosfera absorve parte dessa presença e distribui a sensação de vivacidade pela casa.’’




          C-     Lógica Funcional e Espacial (a partir do corte)

Figura 3 -Corte BB
                           
                Escolheu-se este corte porque é possível perceber-se facilmente a relação entre a envolvente e o edificado, como a casa se relaciona com os muros que a  rodeam  e como os eixos visuais, que este cria, proporcionam relações entre a casa, o jardim e o pátio.
                A abertura  da ‘’bow-window da sala’ ’juntamente com a lareira  são  parte central da sala. Neste corte consegue perceber-se a a forma como esta divisão resulta da  projecção da forma do pátio, servindo quase como um remate desse eixo.
                Consegue perceber-se também a diferença de alturas das diferentes zonas da moradia, com a lareira a ter uma maior altura e dentro da própria sala de estar haver uma variação de cota. É também de notar a forma como o arquitecto cria os eixos visuais da casa relacionando fortemente as partes programáticas entre elas e também criar relações com a sua envolvente. Tal como o eixo pátio cónico/lareira  é também importante a forma como os dois pilares na sala de jantar emolduram a janela da sala jantar e a forma como esse eixo relaciona , a sala de jantar com o esse pátio , assim como a maneira como no sentido oposto este relaciona o pátio com as habitações e toda a zona envolvente.
                Como podemos verificar no corte o pátio e a sala de estar estão ambos alinhados ao longo do eixo central principal, criando assim um eixo visual directo da rua para o pátio, transmitindo imediatamente ao utilizador da casa que esse mesmo pátio é o coração da casa, pois ao colocar este pátio no centro , unifica toda a casa. A este respeito, o assunto da variação das alturas é essencial. ‘’Essas variações não são obtidas com tectos contínuos, mas é a estrutura que se articula por camadas de diferentes cotas’’. A forma como o tecto é disposto unifica as partes programáticas do projecto, as paredes exteriores desenvolvem-se em muros á volta da casa , quase que ‘’penetram’’ na casa transformando-se em paredes interiores.


D-     Aspectos do projecto mais próximos dos modelos canónicas do movimento moderno
                ‘’O sistema estrutural é baseado no modelo corrente ,de pilares, vigas, e lajes em betão armado. Um pano duplo de tijolo furado constitui as paredes exteriores.  Independentemente da banalidade deste sistema, o arquitecto utilizou em pleno o seu carácter pelicular ; assim, nas paredes exteriores, em esquinas, juntas, e vãos, os panos duplos descolam-se de si próprios, e expõem-se em ângulos agudos que acompanham a geometria oblíqua do conjunto. .              Este dispositivo arquitectónico obtém, em última análise, uma ressonância gráfica; como se a matéria do edifício fosse um composto plástico autónomo.
                A Casa António Carlos Siza distancia-se da expressividade matéria e corpórea de anteriores trabalhos; revelada como um agregado ocre, objecto de uma abstracção neoplástica. Esta última não é uma característica permanente ou irrevogável do percurso do arquitecto , mas resultante de um compromisso decorrente das difíceis condições da construção em Portugal em meados dos anos setenta.’’
             Vendo a citação de Siza Vieira numa entrevista em Bawelt em 1990, '’Creo que lo que más me importa es definir la sensación de protección y de abertura. En esta casa esto ha sido posible mediante el control de todos los elementos a la escala adecuada'' ('' Acho que o que mais importa para mim é para definir a sensação de proteção e abertura. Nesta casa, isso foi possível por controlar todos os elementos na escala apropriada'') Consegue notar-se as influências um pouco do funcionalismo humanista de Alvar Alto dado a sua preocupação no funcionalismo da habitação para o irmão, não só de uma perspectiva técnica mas também humana.
                A influência da orgânica de Frank Loyd Wright  é sentida mas as  influências desta obra são   principalmente do Modelo de arquitectura  orgânica de Zevi, tanto em trabalhar em planta livre flexível, atendendo também ao exterior ser um reflexo  do interior, assim como a forma como ele coloca os eixos de abertura das janelas. A cor da casa e a forma como esta é inserida no jardim e na sua envolvente natural. O arquitecto vai buscar também influências Clássicas , Barrocas para a elaboração desta habitação utilizando elementos utilizados na arquitectura clássica como a ilusão óptica de falsa perspectiva.

 

E- Aspectos do projecto mais distantes dos modelos canónicas do movimento moderno
                A moradia afasta-se dos modelos canónicos do movimento moderno , já que se afasta da maioria dos princípios racionalistas de Corbusier , não obedecendo à janela horizontal , ao uso de pilotis , o desenvolvimento da planta é livre mas enquanto a planta livre na arquitectura orgânica obedece a uma certa liberdade/flexibilidade, a de Le Corbusier é imposta pelo funcionalismo técnico.
               Esse afastamento do modernismo é bem explicito quando o arquitecto recria a falsa perspectiva na sala de estar, buscando assim inspirações ao Classicismo em vez do Racionalismo.
 ‘’Obtido em configurações mínimas, este exercício de perspectiva e complexidade espacial, foi comparado ao ethos do Barroco Romano; assim Peter Testa sugere a analogia entre a forma deslocada do capitel do pilar da sala de jantar e os mecanismos de ilusão óptica de Borromini.‘’
                Usa antes muros para delimitar a área de intervenção , e para tencionar o espaço, cria vários eixos de abertura e jogos de opaco/vazio.
                Apesar de ser fortemente marcada pelo modelo orgânico de Zevi, este não tem uma grande preocupação  pela natureza dos materiais mas sim, a sua preocupação é de caracter económico dadas as grandes restrições económicas deste projecto.


                                                                       Bibliografia

·         Àlvaro Siza, 1954-1976, Blau Monographs, Gustavo Gili, SA.

·         Àlvaro Siza 1954-1988

·         Frampton Kenneth, Àlvaro Siza Obra Completa, francesco del Co , escritos de Alvaro Siza
         


      Trabalho Elaborado por :
      André Rodrigues
      Daniel Costa
      Flávio Costa
      Francisco Sousa